segunda-feira, 29 de março de 2010

Carta aberta a Sociedade Baiana


Salvador, 29 de março de 2010.



CARTA ABERTA A SOCIEDADE BAIANA.



Nós da ACEB, comunicamos a toda sociedade baiana, que fomos procurados por uma estudante do Centro Estudantil Padre Torrend, situado no bairro do Tororó, após ter sido expulsa da Casa de estudante de maneira arbitrária, em total inconformidade com o estatuto da Casa. O grupo de pessoas que expulsou a estudante fechou o canal de diálogo com a ACEB, sem maiores explicações.

O Centro Estudantil Padre Torrend existe desde a década de 1970, sendo uma das Residências estudantis de maior importância pela sua história, tendo várias personalidades de destaque no cenário político e acadêmico, a exemplo do ex- governador Waldir Pires, Claudionor, entre outros. A Casa, que já pertenceu à Igreja Católica, hoje pertence ao patrimônio do Estado, porém a mesma encontra-se em condições estruturais muito precárias, como: moradores não matriculados em Instituições de Ensino, poucas pessoas na Casa (tem hoje 8 e capacidade para 25) e até mesmo sem diretoria. Entendemos que a premissa fundamental para se morar numa Casa como essa deva ser o fato de estudar e, se assim não o for, estará ocupando o direito de muitos outros que realmente querem e precisam estudar, mas não tem lugar para morar quando vêm do interior do Estado. Com isso, temos a responsabilidade enquanto ACEB de defender os direitos dos estudantes quando percebemos que esses estão sendo ameaçados.

Nesse sentido, imbuídos do espírito de solidariedade que deve permear a relação entre as entidades e as pessoas, tornamos público essa situação e solicitamos a colaboração na mediação do conflito entre as partes afetadas e no auxílio à revitalização do Centro Estudantil Padre Torrend.

Sem mais para o momento, agradecemos antecipadamente.

sábado, 27 de março de 2010

Bolsas de estudos e crédito estudantil.

Estudantes de baixa renda que querem cursar o ensino superior mas não têm condições financeiras para arcar com as mensalidades de faculdades e universidades privadas, contam com o Programa Universidade para Todos (ProUni). Criado em 2004, o programa oferece bolsas de estudo integrais ou parciais de 50% aos alunos que atingirem as maiores notas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Em contrapartida, as instituições que participam do ProUni, divulgadas pelo Ministério da Educação (MEC) durante a época de inscrições, ficam isentas do pagamento do Imposto de Renda, da Contribuição Social sobre Lucro Líquido, do PIS e do Cofins. O programa faz parte do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) e deve contribuir, até 2011, para o acesso de pelo menos 30% dos jovens de 18 a 24 anos ao ensino superior. De 2004 a 2009, o ProUni já atendeu cerca de 540 mil estudantes, sendo 70% deles com bolsas integrais. Apenas no primeiro semestre de 2009, foram oferecidas 156.416 bolsas de estudo, das quais 95.694 integrais e 60.722 parciais. A previsão é distribuir mais de 247 mil bolsas em 2009.

Fonte: Portal Brasil.

sábado, 20 de março de 2010

Luiz Carlos Prestes: 20 anos sem o "Cavaleiro da Esperança"


Em 7 de março de 1990, desaparecia da vida cotidiana política do Brasil, o inesquecível Senador Luiz Carlos Prestes, nosso Cavaleiro da Esperança, na homenagem de Jorge Amado, sem dúvida um ícone revolucionário da América Latina e do Mundo.

Sua efetiva atuação histórica começou na década de 20, com a Coluna Prestes – o momento culminante do tenentismo – que reuniu um exército guerrilheiro de aproximadamente 1.500 homens e mulheres, comandados por uma dúzia de oficiais do Exército e da Força Pública de São Paulo, entre os quais se destacava Prestes. A Coluna percorreu 25.000 quilômetros, através de 13 estados do Brasil, derrotando 18 generais governistas, sem jamais ter sido desbaratada, apesar do enorme poderio bélico mobilizado contra ela. Inspirados nos ideais de “representação e justiça”, os “tenentes” batiam-se por conquistas como o voto secreto e pela moralização dos costumes políticos, corrompidos pelo domínio oligárquico em vigor durante a República Velha

O assassinato da companheira de Prestes, Olga Benário, resultado de uma perseguição imposta pelo governo de Getúlio Vargas, que a entregou, com respaldo do Supremo Tribunal Federal, à Alemanha Nazista; as prisões; a clandestinidade; os exílios; a perseguição de vários governos ao Partido Comunista Brasileiro, do qual foi secretário geral por muitos anos - nada disso abalou sua convicção de dedicar sua vida à causa de um mundo melhor para todos. Prestes nos falava que guardava do testemunho de vida de Olga “a lição de que o ser humano resiste a qualquer provação com dignidade, quando a sua luta é pela justiça e liberdade”.

Prestes lutou uma vida inteira em prol do ser humano. Nunca se rendeu ao capital. Constituiu-se num exemplo de conduta reta na vida pública. Foi eleito senador, após 10 anos de prisão impostos pelo governo Vargas, e ajudou a elaborar a Constituinte de 1946, uma carta magna avançada para a época, graças à atuação e às propostas aprovadas pela bancada de deputados do PCB, como o direito de greve.

No período do golpe militar de 64, ainda secretário geral do partido, exilou-se em Moscou, por determinação do PCB, pois era o primeiro da lista de perseguições políticas do regime de exceção, que cassou o mandato do presidente João Goulart, de muitos políticos e, principalmente, de militantes de esquerda no país. Na sua volta do exílio, em outubro de 1979, o aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro, foi tomado por uma multidão de 10.000 pessoas, principalmente de correligionários, que queriam ver e ouvir uma das maiores lideranças políticas da América Latina no século passado. O “velho”, como era carinhosamente chamado nesta época por nós que militávamos com ele, discursou, de improviso, do teto de um automóvel e lembrou de citar, um por um, todos os membros do comitê central do PCB, “desaparecidos” pela ditadura que estava no fim.

Por muitos anos minha geração e outras não puderam estudar e conhecer melhor a história do Cavaleiro da Esperança, devido aos anos de arbítrio e restrição dos direitos civis, impostos pelos autoritários de plantão em vários períodos do século 20 no país, fantoches dos interesses imperialistas, que enxergavam e ainda enxergam em Prestes uma ameaça constante à manutenção de um sistema baseado na exploração do homem pelo homem.

A perseguição implacável exercida pelos representantes do capital, durante toda a sua vida, não foi suficiente para fazer calar em Prestes suas convicções socialistas, nem arrefecer seu ímpeto constante no combate ao capitalismo selvagem, que tanta desigualdade, miséria e exclusão social provoca no mundo. Por vezes surgiam divergências entre Prestes e companheiros de lutas quanto às táticas para combater o capitalismo. Nas discussões e embates travados só não abria mão de seus princípios. Não havia possibilidade de conciliar com o inconciliável. Por vezes, esta postura o deixou isolado politicamente. Não importava: seu maior compromisso era com o povo e com as lutas travadas para a sua efetiva libertação e avanços.

Sua maior virtude foi lutar e se entregar pelo que acreditava ser responsabilidade de todos: um mundo melhor. PATRIOTA, COMUNISTA E REVOLUCIONÁRIO, Prestes deixou um exemplo de dedicação integral ao povo brasileiro e à causa internacionalista do socialismo. Neste momento em especial, a classe política de nosso país deveria se mirar na sua conduta. Prestes, apesar de toda a sua liderança e importância histórica, faleceu sem possuir bens e sobrevivia apenas com a colaboração de alguns sinceros e dedicados companheiros de luta e ideais. Inclusive chegou a recusar ofertas e possibilidades legais de pensões e indenizações oferecidas pelo governo como reparação ao que passou nas mãos de seus algozes.

A fim de preservar o seu legado e acervo documental histórico, um grupo de companheiros e correligionários, capitaneados por Anita Prestes, fundou o INSTITUTO LUIZ CARLOS PRESTES, no Rio de Janeiro. As finalidades e atividades do ILCP pretendem envolver, fundamentalmente, a preservação documental e do acervo relacionado às vidas de Luiz Carlos Prestes e Olga Benário Prestes, além da realização, no futuro, de atividades educacionais que visem promover o legado de Prestes junto às novas gerações e a inclusão social, através da implantação de projetos e programas. Além disso, o ILCP vai manter parceria e apoio constantes aos movimentos sociais, principalmente à luta pela reforma agrária, como instrumento fundamental para promover a inclusão social, através da maior riqueza e patrimônio desta nação e do seu povo: a terra.

No mais, fica a nossa convicção de que a conduta e o exemplo de Prestes servem à história deste país como referências permanentes para a construção de um Brasil bem melhor no futuro.

Seu exemplo de dedicação inabalável e intransigente, na causa de uma sociedade mais justa foi o maior legado que devemos transmitir às atuais e futuras gerações. Essa é a nossa grande responsabilidade! Suas idéias não morrerão jamais! Continuarão em cada um que faça da dedicação integral ao ser humano a verdadeira razão de sua existência, para a efetiva colaboração na construção de uma sociedade e mundo mais justos e melhores!

Prestes vive! Viva Prestes!

Marcus São Thiago

Advogado, Educador e Secretário Geral do ILCP- Rio de Janeiro

Fonte: MST

segunda-feira, 15 de março de 2010

O plebiscito em marcha


Sergio Lirio

A última pesquisa eleitoral do instituto Datafolha, publicada no fim de fevereiro, aponta uma queda de 14 para 4 pontos na diferença entre José Serra e Dilma Rousseff. O presidenciável tucano tem agora 32% das intenções de voto, contra 28% da petista. No segundo turno, Serra venceria por 45% a 41%.

Os mais maldosos poderão atribuir o veloz encurtamento da distância entre os dois, para usar uma expressão do também presidenciável Ciro Gomes, ao “efeito âncora”. A âncora, no caso, responde pelo nome de Fernando Henrique Cardoso.

Coincidência ou não, o fato é que a queda de Serra se deu no mês em que FHC decidiu topar o desafio sonhado por Lula: transformar as eleições de outubro em um plebiscito entre as gestões. Em artigo dominical publicado em 7 de feveiro nos jornais O Estado de S. Paulo e O Globo intitulado “Sem medo do passado”, o ex-presidente decidiu fazer por conta própria o que a maioria do tucanato se recusa a fazer, uma defesa de seu legado. Fernando Henrique rejeitou o rótulo de socialmente insensível e propôs: “Se o lulismo quiser comparar, sem mentir e descontextualizar, a briga é boa. Nada a temer”.

Será? Para defender os oito anos de FHC no poder é preciso muito mais do que a disposição de reparar o passado mostrada por grande parte dos colunistas da mídia, de quem justamente o ex-presidente espera uma comparação “isenta” e “contextualizada” dos números. Com um tom de crítica crescente que vai do ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira ao próprio Serra, poucos são os tucanos interessados em relembrar um período no Brasil e na América Latina que mais se assemelha a uma literatura barata de rea-lismo fantástico. Sob o domínio do Consenso de Washington, o México vendeu sua autonomia para ingressar no Nafta, o tratado de livre-comércio com os Estados Unidos e o Canadá. O resultado não deixa dúvidas: o México é hoje uma economia dominada pelo narcotráfico.

Na Argentina, o governo de Carlos Menem prometeu o paraíso do desenvolvimento com a paridade do peso com o dólar. Em 2001, os argentinos acordaram em um pesadelo de panelaços, desordem e desesperança. Até hoje pagam o preço da aventura.

O Brasil não chegou a tanto, lembrarão muitos. É verdade, mas não por vontade de quem esteve no poder. FHC nunca esconde que seu maior sonho era desmanchar a herança de Getulio Vargas e teria obtido sucesso se o Brasil tivesse ingressado na Alca, privatizado a Petrobras e o Banco do Brasil e se sucessivas crises financeiras internacionais não tivessem interrompido o processo de desenvolvimento por meio de poupança externa.

É nesse cenário que desembarcamos em junho de 1998. Faltam quatro meses para as eleições presidenciais e Lula aproxima-se perigosamente de FHC. Em um provável segundo turno, indicam as pesquisas, a diferença entre o presidente em busca da reeleição e o petista cai para 4 pontos porcentuais: 45% a 41%. Os marqueteiros do PSDB sacam da cartola a teoria do caos- (que, com nuances, viria a se repetir em 2002, quando a atriz Regina Duarte foi ao ar revelar seu medo caso Lula fosse eleito). Ou FHC ou o caos, como ilustrou bem a capa da edição 76 de CartaCapital. A mídia saiu a campo para testar a hipótese.

O Estado de S. Paulo, por exemplo, foi ouvir o economista Francisco Gros, à época diretor para a América Latina do banco Morgan Stanley. Gros é um ortodoxo neoclássico. Entre 2000 e 2002, no segundo mandato de FHC, presidiu o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). De 2002 a janeiro de 2003, quando Lula tomou posse, comandou a Petrobras. Foi na sua gestão, aliás, que nasceu a ideia de mudar o nome da estatal para Petrobrax. A oposição acusou os tucanos de querer privatizar a empresa. Os tucanos defenderam a tese de que a troca de nome facilitaria a internacionalização da companhia.

De volta a 1998. Para o Estadão, o executivo financeiro Gros analisou a teo-ria do caos. Suas observações saíram na edição de 15 de junho do diário paulistano: “Os investidores não se impressionarão se a campanha de Fernando Henrique Cardoso pintar Lula como o fim do mundo, porque eles sabem que isso pode ocorrer no atual governo se continuar o descontrole das contas públicas”.

A declaração de Gros desmonta um dos silogismos mais caros aos tucanos. O PSDB pretende-se o benemérito da responsabilidade fiscal no Brasil e suas lideranças costumam repetir o mantra de que a única coisa boa do governo Lula – a manutenção da estabilidade e das metas de superávit primário – é continuidade de FHC.

A história foi diferente e os verdadeiros heróis do equilíbrio fiscal brasileiro são o ex-presidente dos Estados Unidos Bill Clinton e o então presidente do Fundo Monetário Internacional, Michel Camdessus. Mais adiante, relembraremos suas glórias.

Lançado em 1993, ainda no governo-tampão de Itamar Franco, o Plano Real alcançou sucesso imediato no controle da inflação, fruto da engenhosidade da URV e auxiliado pelas boas condições da economia internacional, mergulhada em uma fase dourada de crescimento dos EUA e sobra de capitais em busca de bons investimentos mundo afora.

Cego pelo exercício obtuso do papel de oposição, o PT afundou-se nas críticas ao Real. Quanto mais o partido classificava o plano de “estelionato eleitoral”, mais FHC, apresentado como pai do Real, subia nas pesquisas. Até vencer no primeiro turno e adiar por oito anos o sonho de Lula de conquistar a Presidência.

O controle da inflação não só produziu uma imediata melhora no poder de compra dos brasileiros. Abriu também um novo capítulo na história da gestão pública: após uma década e meia de uma contabilidade esquizofrênica decorrente dos altos índices de inflação, foi possível controlar as contas da União, estados e municípios. A renegociação de dívidas estaduais e de grandes cidades e a incorporação de esqueletos antes escondidos em estatais e autarquias tornaram os números mais transparentes e manejáveis. Méritos, sobretudo, do ministro Pedro Malan.

No mais, o primeiro mandato de FHC representou o caos. No atual debate público nacional, o colunista de CartaCapital Delfim Netto é um dos poucos a não sofrer de amnésia. O ex-ministro nunca deixa de lembrar que em 1998 o Brasil estava FA-LI-DO, como gosta de frisar. Em 2002, no fim do segundo governo tucano, Delfim definiu assim a era fernandina em entrevista à IstoÉ: “O primeiro governo se caracterizou pela conquista da inflação. Foi a única coisa, na minha opinião, realmente interessante. Quando a inflação caiu, se esqueceu de tudo, até do mais importante, que é fazer o equilíbrio fiscal. Os quatro primeiros anos do Fernando foram de farra fiscal, déficits, câmbio controlado, destruindo o setor produtivo brasileiro e ganhando insolvência”.

Ainda Delfim: “O Brasil quebrou em 1998, teve de ir correndo ao FMI pedir 41 bilhões de dólares para acomodar a situação na véspera da eleição. Se o Clinton não tivesse ajudado, o Fernando não teria sido reeleito”.

O câmbio quase fixo virou uma obsessão de Gustavo Franco, presidente do Banco Central. Desenvolvimentistas e ortodoxos se digladiavam no Planalto. A morte de Sergio Motta, primeiro, e os grampos da privatização da Telebrás que derrubariam Luiz Carlos Mendonça de Barros selariam a vitória do que se chamou de malanismo.

Para sustentar o câmbio franquista, o Banco Central do primeiro mandato manteve, entre 1994 e 1998, uma das mais altas taxas de juros da história do País e do mundo. O pico chegou a 45,67%, em meio à crise que abalou os chamados Tigres Asiáticos, em 1997. Na média, ficou em 21%. O real valorizado, por sua vez, estimulava as importações e reduzia a competitividade dos produtos brasileiros no exterior. Os efeitos sobre a estrutura industrial e a taxa de desemprego foram assombrosos (leia o texto).

O populismo cambial provocou efeitos arrasadores nas contas públicas e nas transações correntes, situação que só viria a ser controlada no governo Lula. Entre 1995 e 1998, o saldo nas transações correntes, resultado de todas as operações do Brasil com o exterior, acumulou um déficit de 105,7 bilhões de dólares. Nos quatro anos seguintes, o buraco cresceria em mais 81 bilhões.

Na tentativa de cobrir o rombo, a equipe econômica de FHC valeu-se de três expedientes: as privatizações, o aumento da carga tributária e o endividamento. De 1994 a 2002, a dívida líquida do setor público em relação ao Produto Interno Bruto saltou de 30% para 51,3%. No ano passado, após sete anos de gestão petista, ela ficou em 43% do PIB (em 2008, antes da crise financeira, o índice estava em 38,8%). Outro porcentual: na era fernandina, a dívida cresceu 485% ante cerca de 30% nos anos Lula.

A carga tributária, cuja redução virou a principal bandeira do ameaçado de extinção DEM, o aliado histórico do PSDB, subiu de 25,72% do PIB em 1993 para 31,86% em 2002, 6 pontos porcentuais a mais. Em 2003, ela ficou em 31,41% e, em 2009, fechou em 35,02% (4 pontos acima).

Malan sempre atribuiu a disparada da dívida pública à incorporação de esqueletos (débitos estaduais por conta da renegociação e rombos nas estatais). Tem razão em parte o ex-ministro. Sem os juros estratosféricos do período, a elevação da dívida pública estaria mais para uma maratona do que para uma prova de 100 metros rasos. Em 1994, a dívida líquida do setor público era de 153,2 bilhões de reais. Em 1998, de 385,9 bilhões (em 2002 alcançaria a marca de 896,1 bilhões). Os tais 485%. De 2003 a 2008, passou de 933,6 bilhões de reais para 1,2 trilhão.

O Brasil teria afundado em 1998 não fosse a intervenção de Bill Clinton. Principal voz do FMI, os Estados Unidos queriam evitar o fracasso de FHC e a vitória eleitoral do “populista” Lula. Por determinação de Clinton, o Fundo emprestou 41 bilhões de dólares, a maior operação de crédito na história da instituição criada em 1945. Quando a cavalaria do FMI veio em socorro, os caciques das finanças globais já haviam retirado do País cerca de 30 bilhões de dólares. O empréstimo viabilizou a reeleição do presidente tucano, que prometeu durante a campanha não desvalorizar o real. A promessa foi quebrada no primeiro mês do segundo mandato. Em janeiro de 1999, após a adoção da peripatética banda diagonal endógena de Francisco Lopes, o mercado forçou a desvalorização e lançou a economia brasileira em uma espiral de desarrumação e inflação. Arminio Fraga, funcionário do megainvestidor George Soros, foi chamado para apagar o incêndio. Os juros voltaram ao patamar de 45% e o Banco Central adotou as metas de inflação. Os custos sociais e econômicos perduraram até a metade do primeiro mandato de Lula. Empresas e consumidores endividados em dólar quase foram à falência. A mídia brasileira, que tanto louva o legado de FHC, esteve à beira da bancarrota, em uma crise de endividamento que custou mais de mil postos de trabalho só em São Paulo.

Presidente do FMI, Camdessus atendeu a ordem de Clinton, mas impôs condições ao governo brasileiro. O câmbio passaria a ser flutuante, o Estado seria obrigado a produzir um superávit primário, inicialmente da ordem de 3% do PIB. Os técnicos do fundo também enviaram à equipe econômica o modelo de uma legislação adotada em países que enfrentaram crises de balanço de pagamentos, o México entre eles: a chamada lei de responsabilidade fiscal.

A César o que é de César, portanto. O pai do equilíbrio fiscal nativo é o francês Camdessus. Em números: em 1996, o setor público registrou um déficit primário de 0,10% do PIB. No ano seguinte, o rombo subiu para 0,96%. Em 1998, um ligeiro resultado positivo, de 0,02%. Após o acordo com o FMI e até 2009, por causa da crise, a economia da União, estados e municípios nunca ficou abaixo de 3% do PIB.

Senhores absolutos da opinião pública, os neoclássicos nativos impuseram a tese de que o desenvolvimento se daria pelo financiamento externo. Segundo essa teoria, os investidores internacionais atraídos ao País pela privatização e abertura da conta de capitais provocariam um aumento na taxa de investimento da economia e levariam a um ciclo virtuoso de crescimento, inovação tecnológica e geração de empregos.

Ministro do Planejamento no primeiro governo FHC, o economista Luiz Carlos Bresser-Pereira sempre foi um crítico dessa teoria e dessa opção. O tempo lhe deu razão (a propósito, ler entrevista nesta edição à pág. 54). “Em 1994, tínhamos praticamente zero de déficit em conta corrente e a taxa de investimento da economia era de 17% do PIB. Em 1999, o déficit chegou a 4,7%, mas a taxa de investimento estava estacionada nos mesmos 17%.” Tradução: a poupança externa foi usada para financiar o consumo tão celebrado nos primeiros anos do Real (do iogurte à dentadura).

A ideia de um Estado enxuto e eficiente na era fernandina em contraposição a uma máquina pública aparelhada e inchada no período Lula é outro ponto que não resiste aos fatos. Apesar da tentativa inicial de Bresser-Pereira e da forma atabalhoada como as agências regulatórias foram implantadas, nem FHC nem Lula se dedicaram a uma reforma real do Estado. O total de servidores públicos em 1994 era de 583 mil. Em 2002, por conta das privatizações e das aposentadorias precoces estimuladas pelos projetos de reforma da Previdência do setor, o número caiu para 485,7 mil. Durante o governo petista houve uma recuperação: em 2009, a quantidade de servidores beirava os 550 mil. Em termos de gastos em proporção do PIB, FHC gastava mais com o funcionalismo em seu último ano de mandato do que Lula (4,93% ante 4,7%). Dos 20 mil funcionários em cargos de confiança até junho do ano passado, 26,6% não tinham vínculos com o serviço público.

O PT argumenta que os reajustes salariais e os concursos públicos durante a era Lula tiveram o objetivo de refazer a máquina desmantelada no período anterior. Trata-se de novos médicos, professores, fiscais, policiais. O argumento esconde, porém, que parte dos aumentos de salários foi simples concessão a uma das bases mais sólidas do partido, os servidores, e não veio acompanhada de critérios objetivos de avaliação e controle de eficiência. A péssima qualidade dos serviços públicos e a incapacidade de o Estado planejar e executar projetos de longo prazo são o custo altíssimo dessa concessão.

Em tese, o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foi uma resposta a esse imobilismo, sustentado no primeiro mandato de Lula quando pairava sobre o governo a aliança de Antonio Palocci com o setor financeiro. O PAC, administrado por Dilma Rousseff continua aquém de seus propósitos e até o momento não foi capaz de elevar a taxa anual de investimento da economia, que fechou em 18,97% do PIB em 2008. Na China, o porcentual roça os 40%.

Por fim, o crescimento da economia foi muito mais medíocre com os tucanos que com os petistas. Em média, o PIB expandiu-se a 2,32%, enquanto a média mundial ficou em 3,53%. Com Lula, o País não alcançou o desempenho de China, Índia, Rússia ou mesmo da Venezuela, mas nos aproximamos mais da média planetária: 4,20% ante 4,38%.

Fonte:CartaCapital